Esses dias, revendo algumas fotos no meu computador, me deparei com uma série de fotos da época em que eu ainda tocava a ONG e milhões de projetos em paralelo. Como se não fosse suficiente ter fundado uma ONG, produzir conteúdo para blog, instagram, youtube e dar aula no Centro Europeu, eu ainda me voluntariava em outros 2 projetos de forma fixa, tinha uma coluna na Gazeta do Povo e fechava alguns projetos em paralelo.
Como eu conseguia dar conta?
Não dava! Vivia sobrecarregada, me enrolava com as datas e com os afazeres, mal tinha tempo pra estudar, descansar, ter vida social!
Lembro como se fosse ontem de uma viagem que fiz, em um desses projetos que participava como voluntária, como fiquei completamente perdida sem ter que trabalhar por 6 dias. Fomos para a Amazônia e, na comunidade ribeirinha que dormimos, não havia sinal de celular, wi-fi e quase não tínhamos luz elétrica disponível. Ou seja, o celular passou boa parte do tempo desligado. Naqueles dias me dei conta de quantas coisas eu fazia só porque achava que tinha que postar, gerar conteúdo, fazer para agradar os outros ou parecer ser algo que não sou verdadeiramente. Comecei a me questionar: ˜O que eu vou fazer agora que eu não preciso mostrar nada para ninguém?˜ ˜O que eu estou, de fato, com vontade de fazer?˜ Foi uma experiência muito maluca pra mim. Quando voltei da viagem passei 2 meses offline. Longe do instagram. Me redescobrindo.
Hoje, quando olho para a quantidade de prêmios que ganhei, as publicações em revistas e jornais em que saí, as inúmeras palestras que dei, os projetos que me envolvi mesmo estando já sobrecarregada, sinto certa pena daquela Gabrielle que não conseguia enxergar o esforço gigante que ela estava fazendo para se sentir aceita, amada, valorizada, para provar coisas para pessoas que nem sequer importam.
Sabe aquele clichê “todo excesso esconde uma falta”? Vivi na pele e, na época, mal conseguia enxergar.
Em uma das palestras que dei, em Portugal, lembro de estar super empolgada, afinal, era minha primeira palestra internacional. O evento foi incrível! Conheci pessoas incríveis mas, ao chegar no hotel, chorei. Naquela noite minhas amigas estavam comemorando o aniversário de uma delas, na minha cidade natal e eu estava longe, sozinha, cheia de bajuladores ao meu lado e tudo que eu queria era estar com as pessoas que me amavam muito antes de eu conquistar qualquer reconhecimento profissional.
Muita gente ainda me pergunta se eu não sinto falta dessa época, da vida agitada que eu vivia, cheia de viagens, projetos, eventos sociais, um networking incrível… E tudo que eu posso dizer pra vocês com toda certeza é: eu não poderia estar mais feliz e preenchida do que com a vida que tenho hoje. PRESENTE na vida das pessoas que realmente valem a pena. Trabalhando como mentora nutricionista, em projetos que preenchem muito mais que meu ego. Com uma rotina que me permite ter flexibilidade, ter tempo para mim, para os meus amados, com certa previsibilidade.
Tenho muito orgulho de ter tido a coragem de deixar tudo aquilo pra trás, ainda que tenha sido doloroso. O mundo da fama e do status podem facilmente nos envolver numa vida de superficialidade e hoje vejo como eu preenchi todos os espaços da minha vida com trabalho e compromissos para não ter que lidar com os meus mais assustadores fantasmas.
Quando estava prestes a começar esse processo de mudança, desenvolvi um medo do mar que me dominava sutilmente. Por orientação da minha psicóloga na época, comecei a fazer aula de surf, tentei não deixar o medo me tomar porque, segundo ela, a tendência era piorar. No fim da sessão em que ela me deu essa instrução, uma informação ficou gravada na minha memória: ˜O mar e a água significam nosso mundo inconsciente˜ – só hoje consigo perceber o tamanho do medo que eu tinha de dar espaço para que meu inconsciente fosse trazido à luz.
Você que já leu até aqui pode estar se perguntando: “Mas o que esse post tem a ver com alimentação?” – TUDO!
A minha relação com a comida também só melhorou quando eu parei de fugir de mim mesma. Parei de tentar anestesiar minhas dores. Parei de tentar agradar mais aos outros do que a mim mesma. Parei de tentar usar o reconhecimento profissional para criar uma armadura e um muro gigante entre eu e o mundo só pra esconder uma insegurança gigante.
Resolvi (ou fui praticamente forçada pela vida) a olhar e encarar meus sentimentos. A dar espaço para que eles emergissem e descobri uma série de coisas que eu não queria ver em mim. Foi o processo mais dolorido pelo qual eu já passei – e durou anos (uns 2, eu diria). Não é fácil perceber a quantidade infinita de coisas que a gente usa como álibi para fugirmos de nós mesmas.
Descobri que se eu não curasse minhas feridas emocionais, nunca conseguiria dar espaço para que conexões reais – e mais profundas – fossem estabelecidas com as minhas amigas (ou com qualquer pessoa). Conversei com elas sobre coisas que eu nunca, em mais de 15 anos de amizade, tinha tido coragem de falar. Abaixei a guarda com todos aqueles que eu costumava ter receio de baixar. Exercitei minha fé falando a verdade sob qualquer circunstância e deixando que Deus encaminhasse os desdobramentos dela na minha vida. Me mostrei vulnerável e doeu. Muito. Mas foi a dor que me trouxe mais leveza na vida.
É claro que isso tudo é um processo. Leva tempo e eu acho que ainda tem muita coisa para ser observada e para acontecer nessa caminhada que é a vida, mas fico feliz de poder dar espaço para a Gabi de verdade imergir. Para assumir para mim mesma que não é a fama, o dinheiro, o status ou o reconhecimento profissional que vão preencher meu coração. Ainda que sim, sejam aspectos importantes, também preciso do contato com as pessoas que amo, também preciso abrir espaço para uma relação amorosa, para uma futura família e, mais importante, preciso me sentir bem na minha própria pele porque enquanto isso depender de fatores externos, é impossível se sentir completa e feliz de verdade.
Nesse caminho a comida deixou de ser uma anestesia, deixou de ser o único momento de diversão, de automimo, de indulgência, e começou a preencher um espaço diferente na minha vida – de autoamor, de nutrição, de responsabilidade, de disciplina, de comprometimento, e de conexão (social também).
Os prêmios, o reconhecimento, a fama, o status, tudo isso ainda tem seu espaço na minha vida, mas já não corro atrás disso. Eles podem vir como consequência de um servir com o coração, de um trabalho bem feito. Desde que não comprometa a construção e manutenção daquilo que realmente importa pra mim, e desde que não me coloque em uma posição em que eu precise ser diferente do que eu realmente sou.
Se conhecer, saber quem você é, o que gosta, o que está disposto, onde quer chegar, e principalmente o que tem VALOR pra você é impagável! Te permite criar conexões reais, profundas, baseadas na verdade. Te impede de construir barreiras desnecessárias e até mesmo de tentar se encaixar só por medo ou insegurança. Te permite estar segura para se manter somente nos lugares onde você se sente confortável e, falando de uma perspectiva de profissional da saúde, isso vai te ajudar a manter seu sistema nervoso regulado, seu cortisol em níveis saudáveis e seu organismo trabalhando de forma mais equilibrada (o que, com certeza vai mudar sua relação com a comida). É por isso que na minha mentoria nos aprofundamos nas questões emocionais também. Um resultado a longo prazo só nasce de uma mudança profunda de mindset, de relação com o alimento e de comportamento.
É preciso enfrentar o medo voluntariamente. Acredite em mim: não machuca! Pelo contrário, te fortalece. E não existe nada melhor que viver sem ter que carregar o peso dessa armadura.
Eu sou a Gabi ? Sou arquiteta urbanista e metida a cozinheira! Desde que resolvi entrar no mundo do esporte, mudei minha alimentação e, consequentemente, meu olhar sobre o mundo e sobre o meu corpo. Hoje sou maratonista, me locomovo principalmente de bike, não consumo carne há três anos, intolerante à lactose, e vivo inventando moda na cozinha, onde aprendo muito todo dia